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Racismo: Como procurar eliminá-lo, sem traumas

Por Eduardo Neves Moreira


As recentes manifestações que vem assolando os EUA e várias outras nações por esse mundo afora, são fruto de uma inquietude decorrente das condições em que as populações se encontram diante da expansão e dos malefícios da pandemia. Não é que tais sentimentos já não existissem: eles estavam adormecidos pelo movimento social e econômico das sociedades e não havia tempo suficiente para que uma parcela maior daqueles que se encontravam insatisfeitos viessem a desenvolver um processo de questionamento e de manifestações mais contundentes.

Entretanto, diante do isolacionismo que surgiu e não tem prazo para se extinguir, começaram a aflorar movimentos e grupos dispostos a vir a público e colocar todas as suas revoltas e queixumes, usando como tema o assassinato do jovem segurança negro, George Floyd, quando foram evocados nomes que se destacaram na luta contra o preconceito racial nos EUA, tais como o pastor Martin Luther King e a ativista Ângela Davis.

Tais protestos foram além, pois independentemente do tema racial outros fatores têm sido invocados e os ativistas políticos sempre se aproveitam de oportunidades como essa para procurar colocar na ordem do dia suas ideologias e reivindicações. Isto é altamente condenável, principalmente no momento em que o confinamento se recomenda como forma de combate ao Covid-19 e os contatos sociais que essas manifestações impõem criam grandes aglomerações, com as consequentes e prováveis contaminações.

Quem conhece a história da humanidade, desde as épocas mais distantes até às mais recentes, sabe muito bem que a escravidão sempre foi usada pelos grupos mais poderosos contra os mais fracos e foi usada por todas as grandes potências e nações desde que o mundo se conhece. O império romano, por exemplo, quando de sua expansão assim o fazia e era uma das condições que permitiram sua grandiosidade e duração. Muitos outros e inúmeros exemplos poderiam ser citados, seja entre europeus, asiáticos e os africanos.

Ao falarmos dos africanos, aí chegamos à origem de boa parte do questionamento de hoje, pois a atual revolta prende-se exatamente com a denúncia da escravidão a que forma submetidos povos africanos e que foram conduzidos para o continente americano. Para quem não sabe ou está esquecido, deve-se observar que os reis e sobas africanos, de uma forma geral, tinham por prática habitual, quando dos conflitos tribais e étnicos, aprisionarem os derrotados e os submeterem ao processo escravagista durante toda a sua existência, constituindo-se numa constância que durou séculos e que, ainda em anos recentes continua a ser denunciada à ONU.

Por ocasião da expansão marítima portuguesa e seguida por outras potências europeias à época, quando as naus portuguesas aportaram na costa africana, muitos foram os contatos estabelecidos com as populações lá encontradas e criadas condições de trocas comerciais entre eles. Nessa ocasião, começaram a ser oferecidos aos portugueses e como moeda de troca, os escravos que tais líderes possuíam, sendo que, inicialmente e até por ingerência da Igreja Católica, os portugueses relutaram em aceitar esse tipo de negócio pois era indesejável sob o ponto de vista humano e religioso. Acontece que quando os portugueses, em decorrência da necessidade de ocupação e desenvolvimento das terras descobertas e conquistadas, viram que não possuíam gente suficiente para manter esses territórios, acabando por encontrar na aceitação do escravagismo como uma solução da viabilidade de seus objetivos. Era uma opção que teve que ser exercida: ou a escravidão negra ou a quase certeza de que se perderiam os territórios encontrados. Foi assim que a escravidão negra se efetivou no Brasil e também condições, de certa forma semelhantes, ocorreu em outras partes do continente americano, inclusive nos EUA.

Foi por razões solidárias e mediante a interferência constante da Igreja Católica que a Princesa Isabel assinou a abolição da escravidão, que foi um ato de coragem, pois era grande a oposição dos proprietários de terras e de empresas ao sugerido, custando isso, por ser o seu fator principal, o fim do Império Brasileiro, impondo-se a Proclamação da República em 1889.

É perfeitamente compreensível, que os negros, mesmo libertos dessa absurda escravidão, não possuíam recursos e passaram a constituir a parcela mais pobre e oprimida da população brasileira, pois não tinham recursos em sua maioria esmagadora, submetendo-se para sua sobrevivência, a trabalhos os mais humildes e pesados, situação que se reflete até à atualidade, mas que por ações governamentais vem sendo corrigida progressivamente.

Identificam-se problemas e necessidade de ações complementares para que a sociedade brasileira possa vir a ser mais coerente e solidária, oferecendo condições de acesso a todos os cidadãos independentemente da cor de sua pele, mas não é com passeatas, agressivas e destrutivas, que vêm sendo utilizadas politicamente, que conseguiremos chegar a uma sociedade plural em termos de sociabilidade e de progresso, pois o acirramento desses movimentos, ao invés de permitir o que se almeja, poderá conduzir o país, ao aumento da discriminação racial e da violência. Se queremos eliminar o racismo, é tomando medidas que permitam o tratamento igualitário a todos os cidadãos e eliminando a menção da cor da pele e a origem de todos, pois como diz a Constituição: todos devem ser iguais perante a Lei.

EDUARDO NEVES MOREIRA

Vice-Presidente da Academia Luso-Brasileira de Letras

Ex-Deputado da Assembleia da República Portuguesa

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